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CORONAVÍRUS

As lições que podemos retirar das consequência económicas da Peste Negra

Há muitas e importantes lições que podemos retirar das consequências económicas que derivaram da Peste Negra e que podem ser hoje aplicadas ao coronavírus.

As preocupações com a disseminação do novo coronavírus traduziram-se numa desaceleração económica. As bolsas de valores foram afetadas: o FTSE 100 do Reino Unido viveu os seus piores dias de negociação desde há muitos anos, assim como a Dow Jones e a S&P nos EUA. O dinheiro tem que ir para algum lado e o preço do ouro — visto como uma mercadoria estável durante eventos extremos — atingiu um valor recorde dos últimos sete anos.

Uma retrospetiva da história pode ajudar-nos a considerar os efeitos económicos das emergências de saúde pública e a melhor forma de gerir-las. Ao fazer isso, no entanto, é importante lembrar que as pandemias passadas eram muito mais mortais do que o coronavírus, que tem uma taxa de mortalidade relativamente baixa.

Sem a medicina moderna e instituições como a Organização Mundial da Saúde, as populações passadas eram mais vulneráveis. Estima-se que a praga justiniana de 541 d.C. matou 25 milhões e a gripe espanhola de 1918 à volta de 50 milhões.

De longe, a pior taxa de mortalidade da história foi infligida pela Peste Negra. Durou entre 1348 e 1350, matando entre 75 e 200 milhões de pessoas em todo o mundo. As consequências económicas também foram profundas.
“Raiva, antagonismo, criatividade”

Pode parecer contrafactual — e isso não deve minimizar o tumulto psicológico e emocional contemporâneo causado pela Peste Negra — mas a maioria dos que sobreviveram passou a desfrutar de melhores condições de vida.

Após a pandemia, a escassez de mão-de-obra levou a um aumento de salários dos trabalhadores. As dietas dos trabalhadores também melhoraram e incluíram mais carne, peixe fresco, pão e cerveja. Embora os proprietários lutassem para encontrar inquilinos para as suas terras, as alterações nas formas de posse melhoraram as rendas.

Mas o período após a Peste Negra foi, segundo o historiador económico Christopher Dyer, um período de “agitação, excitação, raiva, antagonismo e criatividade”. A resposta imediata do Governo foi tentar conter a maré de oferta e demanda da economia.

A lei do Estatuto dos Trabalhadores foi aprovada em 1351, na tentativa de fixar os salários nos níveis anteriores à praga e restringir a liberdade de movimento dos trabalhadores. Outras leis foram introduzidas tentando controlar o preço dos alimentos e até restringir quais mulheres podiam usar tecidos caros.

Mas esta tentativa de regular o mercado não funcionou. A aplicação da legislação trabalhista levou a protestos. A longo prazo, os salários reais aumentaram à medida que o nível da população estagnava com surtos recorrentes da praga.

Os proprietários lutaram para chegar a um acordo relativo às alterações no mercado como resultado da perda de população. Após a Peste Negra, houve uma migração em larga escala, pois as pessoas aproveitavam as oportunidades para se mudar para terras melhores ou procurar o comércio nas cidades. A maioria dos proprietários foi forçada a oferecer acordos mais apelativos para garantir que os inquilinos cultivassem as suas terras.

Uma nova classe média de homens surgiu. Eram pessoas que não nasceram no interior da nobreza, mas foram capazes de gerar riqueza em excesso suficiente para comprar lotes de terra.

A dramática mudança populacional provocada pela Peste Negra também levou a uma explosão na mobilidade social. As tentativas do Governo de restringir esses desenvolvimentos seguiram-se e geraram tensão e ressentimento.
Lições para os dias de hoje

Embora a praga que causou a Peste Negra tenha sido muito diferente do coronavírus que se está espalhar hoje, existem algumas lições importantes para o crescimento económico futuro. Primeiro, os Governos devem ter muito cuidado em gerir as consequências económicas. Manter o status quo dos interesses adquiridos pode provocar inquietação e volatilidade política.

Segundo, restringir a liberdade de movimento pode causar uma reação violenta. Até que ponto a nossa sociedade moderna e móvel consente a uma quarentena, mesmo quando é para um bem maior?

Além disso, não devemos subestimar a reação psicológica instintiva. A Peste Negra viu um aumento nos ataques xenófobos e antissemitas. O medo e a desconfiança de não-nativos mudaram os padrões de negociação.

Economicamente falando, vão haver vencedores e perdedores à medida que a atual emergência de saúde pública se desenrola. No contexto da Peste Negra, as elites tentaram entrincheirar o seu poder, mas a mudança da população a longo prazo forçou um reequilíbrio em benefício dos trabalhadores, tanto em termos de salários e mobilidade, como na abertura do mercado de terras para novos investidores.

O declínio da população também incentivou a imigração, embora ocupem empregos pouco qualificados ou com baixos salários. Todas são lições que reforçam a necessidade de respostas medidas e cuidadosamente ponderadas dos Governos atuais.

// The Conversation