Opinião O tempo de África Um crescimento económico sustentado e um aumento significativo em investimento directo estrangeiro são apenas dois capítulos na narrativa emergente do continente africano na última década. Um estudo publicado pela consultora Ernst & Young, que mistura números e histórias, comprova que África está aberta aos negócios. E que Portugal foi o país que mais projectos realizou em Angola.
Mas e antes de se passar aos números, o estudo em causa oferece uma história bem contada, não de leões e caçadores, mas sim de um continente em franca expansão e progresso, com enorme potencial e lucros também. Para além de dados internos da própria consultora, foram ainda entrevistados mais de 500 executivos de topo africanos, cujos contributos deram mais cor à história contada por este relatório. O VER resume o essencial do estudo, com especial atenção não só para as actuais forças, mas também para os principais desafios que o continente tem ainda de enfrentar. A narrativa africana emergente
Estas mudanças estruturais ajudaram a revigorar os mercados e o comércio, criando um ambiente que, de forma crescente, está a atrair novos negócios e investimentos. Com as reformas alargadas em conjunto com melhorias significativas na governança política e, especialmente, com a explosão das commodities, o nível de rendimento disponível aumentou, bem como a urbanização e um sector de serviços em rápido desenvolvimento tem vindo a contribuir para o que os autores do relatório apelidam de “caminho de crescimento sustentável” em África. Todavia, subsistem ainda algumas barreiras internas ao crescimento, nomeadamente as que impedem o livre comércio intra-regional. Todavia e neste momento, os olhos estão virados para 2014, ano em que se espera que 26 países africanos, com uma população combinada de 600 milhões de pessoas e um PIB de aproximadamente um bilião de dólares se unam numa área comum de comércio livre. Adicionalmente, foram identificadas três outras barreiras importantes que inibem o comércio intra-regional. A primeira consiste na ausência de integração de sistemas que permitam a livre circulação de pessoas, bens e serviços entre fronteiras. A segunda está relacionada com as infra-estruturas deficitárias e a terceira é o facto de não existir uma suficiente diversificação industrial entre os países africanos. Ou seja, em muitos casos, os vizinhos produzem produtos similares e não existem grandes razões para que se estabeleçam relações comerciais entre eles. A solução passa, por isso, por fortalecer a competitividade das economias africanas num conjunto de várias indústrias. E, para ultrapassar este desafio, é necessária uma aposta na educação de excelência e no desenvolvimento de competências, nas reformas microeconómicas e numa gestão macroeconómica mais forte. Percepção versus realidade
Os resultados do inquérito revelam ainda que as percepções negativas sobre África são, em primeiro lugar, relacionadas com os factores de risco político, citando a instabilidade do ambiente político, a corrupção e as fracas condições de segurança como os maiores obstáculos ao investimento. Por outro lado, os números reflectem também uma ambivalência clara. Desde 2007, em particular, e mesmo contando com o impacto negativo da recessão económica global, existiu um forte crescimento no número de projectos de IDE em África (a uma taxa de crescimento perto dos 20%). A tendência manteve-se o ano passado, com o número de projectos muito próximo do pico de 2008 e com uma taxa de crescimento anual na ordem dos 27%. Mas e apesar de estas cifras reflectirem a resiliência e a atractividade crescente de África como um destino de investimento, ao mesmo tempo, o continente no seu todo só conseguiu atrair 5,5% dos projectos globais de IDE em 2011. E, apesar de tal representar um aumento sólido comparativamente aos 4,5% do ano anterior, e de ser, na verdade, a maior proporção de IDE global jamais investido no continente, não reflecte, de acordo com os autores, a sua verdadeira história de crescimento. Sendo assim, por que motivo existe este abismo em termos de percepção relativa? Um dos factores principais é o gap de percepção existente entre as crenças históricas sobre o continente e a realidade positiva do seu crescimento ao longo da última década. E, como resultado, os investidores continuam a ter uma abordagem demasiado cautelosa quando pensam fazer negócios em áfrica. Assim, para os autores do estudo, é importante identificar e desmistificar os factores que mais contribuem para esta inibição: África em democratização acelerada
Para contextualizar, se, em 1990, a maioria dos estados africanos eram definidos como “autocracias”, hoje apenas a Eritreia e a Suazilândia são classificados como tal. Em contraste, só no sudeste asiático, a mesma classificação assenta para a China, para a Coreia do Norte e para o Vietname. Adicionalmente e de acordo com o Índice de Democracia 2011 publicado pela Economist Intelligence Unit, países africanos como Cabo Verde, as Maurícias e a África do Sul aparecem à frente de países desenvolvidos como a França e a Itália e bem destacados face a todos os BRIC e à grande maioria de mercados emergentes, incluindo aArgentina, a Colômbia, a indonésia, a Malásia, a Polónia, a Tailândia e a Turquia. O desafio da corrupção
Mas a verdade é que de acordo com o mais recente ranking de “facilidade para fazer negócios” publicado pelo Banco Mundial, 14 países africanos posicionam-se, neste indicador, à frente da Rússia; 16 com melhores resultados do que o Brasil e 17 a terem uma nota superior à Índia. Por outro lado, e apesar de a corrupção continuar a ser um dos maiores desafios da região, de acordo com a Transparency International, e com o seu índice de percepção da corrupção, são 14 os países africanos que obtêm melhor classificação comparativamente à Índia e 35 relativamente à Rússia. De forma similar, no índice de corrupção publicado pelo Fórum Económico Global, relativamente a 2010-2011, as comparações são ainda mais surpreendentes. Por exemplo, no item “pagamentos irregulares e subornos”, o Botswana, o Ruanda e Cabo Verde situam-se numa posição muito melhor do que os Estados Unidos e, para além de estes três países, também a Gâmbia, as Maurícias, a Namíbia e a África do Sul alcançam uma classificação melhor comparativamente ao Brasil e à China. Dezasseis países africanos – incluindo a Etiópia, Moçambique e o Zimbabué – estão á frente da Índia e um total de 19 bem acima da Rússia. Facilidade crescente para fazer negócios em África
Mas e mesmo assim, o relatório aponta para a crescente facilidade de se fazer negócios em muitas regiões africanas. E são também vários os mercados africanos que, comparativamente a outros mercados de rápido crescimento noutras regiões, se estão a comportar muitíssimo bem. Utilizando-se a pesquisa do Banco Mundial “Doing Business” como um dos principais indicadores desta tendência, são muitas as economias africanas que apresentam progressos substanciais. Entre as 30 economias que, a nível global, melhoraram o ambiente regulatório para os negócios, especialmente nos últimos cinco anos, um terço pertence à África subsaariana. E, durante esse mesmo período, 13 países africanos figuram no top 10 de “reformadores de negócios” do Banco Mundial. Em 2011, e com base na mesma pesquisa, 78% dos governos da África subsaariana - um número recorde – alteraram o seu ambiente económico regulatório para facilitar os negócios. Este tipo de progresso é traduzido num aumento constante de performance para muitos países africanos no ranking “Doing Business” do Banco Mundial. E, já na edição correspondente a 2012, o mesmo ranking coloca oito países africanos à frente da China – o mais bem posicionado país entre os BRIC – 14 à frente da Rússia, 16 à frente do Brasil e 17 à frente da Índia. O mais bem posicionado país africano – as Maurícias – está à frente da Áustria, Bélgica, França, Holanda e Suíça. E a África do Sul, o país seguinte mais bem qualificado, situa-se acima da maioria dos mercados emergentes. Guia de forças e fraquezas para os investidores
RECURSOS Força de trabalho alargada. Está previsto um crescimento da população em idade activa em África bastante superior ao dos países emergentes na Ásia ou na América Latina nos próximos 10 anos. Custos laborais muito competitivos. É expectável que os custos laborais unitários se mantenham baixos na próxima década. Salários mais altos na China e na Índia irão abrir as portas a novas oportunidades por parte de outros mercados emergentes em África enquanto produtores de baixo custo. Os desafios Assegurar os benefícios do IDE para as comunidades. Na maioria das vezes, quando um país cresce depressa demais, a desigualdade acompanha esse crescimento e os países africanos têm de assegurar que os acordos no que respeita ao investimento directo estrangeiro beneficiam as suas comunidades. MERCADO Grande potencial para o turismo. O sector do turismo já é responsável por mais de 20% das receitas de exportação em muitos países africanos, incluindo a Etiópia, o Egipto e a Tanzânia, e são muitos os países com enorme potencial para explorar este sector com investimento apropriado. Os desafios PIB per capita. Muitos dos países de elevado crescimento na África subsaariana, como o Gana, a Nigéria, e a Etiópia possuem ainda rendimentos per capita muito baixos comparados com países emergentes de outras regiões, apesar de estarem a gozar de um elevado crescimento nos últimos anos. O que é em parte devido à elevada desigualdade existente em muitos destes países. Aumento dos gastos dos consumidores. Apesar de a base de consumidores em África ser extensa, os rendimentos actuais são baixos, o que irá limitar a dimensão do mercado para a venda de produtos de consumo no início, mas com bastante potencial para um crescimento no futuro. EFICIÊNCIA Fusos horários semelhantes aos da Ásia, Estados Unidos e Europa. África partilha partes dos seus dias de trabalho com a Ásia, os EUA e a UE. Os desafios Facilidade em fazer negócios. Muitos países da África subsaariana posicionam-se abaixo da Ásia e da América Latina no índice “Doing Business” do Banco Mundial. Contudo, o relatório revelou que 36 em 46 governos melhoraram o seu ambiente económico regulatório para os negócios domésticos em 2010-11, um número recorde desde 2005. MOTIVOS ESTRATÉGICOS Os desafios
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