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PERU

O peixe sumiu

Este porto em Chambote no norte peruano, cheira a peixe o ano todo. Mas quando a temporada da anchoveta começa, no final de novembro, as fábricas expelem colunas de uma nauseante fumaça que impregna o ambiente, atingindo locais a quilômetros do porto.

“Este é o cheiro do dinheiro”, diz o sorridente taxista aos visitantes que franzem os narizes à medida que se aproximam da zona industrial 27 de Octubre, onde mais de 20 fábricas trabalham a pleno vapor.

O Peru é a segunda maior nação pesqueira (depois da China) e 85% do pescado é a anchoveta. Tem gosto de anchova só que é pouco menos salgada, e algumas pessoas comem como se fossem sardinhas. Quase tudo é cozido para virar farinha de pescado, um alimento para peixes de fazenda e porcos. O Peru exportou mais de um milhão de toneladas dessa farinha em 2010, no valor de 1,6 bilhões de dólares, principalmente para a Ásia.

Todo ano mais de 6 milhões de toneladas de anchoveta chegam às docas, provenientes de mais de 100 usinas de farinha de pescado, e de plantas industriais que enlatam a farinha e aproveitam outros subprodutos. O que acontece dentro destas fábricas é conhecido somente pelos funcionários e inspetores contratados pelos empresários.

Penetrando nestas fábricas, O ICIJ, descobriu que pelo menos 630 mil toneladas de pescado desapareceu nos últimos dois anos e meio no percurso entre o navios e as balanças das fábricas. Quantidade maior de pescado que os navios britânicos descarregam em um ano.

O Ministério de Produção, que regula a pesca, negou acesso ao banco de dados que controla a atividade. Mas o ICIJ, trabalhando com o grupo peruano de reportagem investigativa IDL-Reporteros, obteve e analisou dados desde 2009 de mais de 100 mil cargas de anchoveta nos portos do norte e do centro do Peru, destinos de 90% dos peixes.

O resultado é assustador: 52% dos desembarques entre 2009 e a primeira metade de 2011 tiveram discrepâncias de mais de 10% entre a pesca declarada pelos navios e a pesca pesada na fábrica.

Essas 630 mil toneladas de anchovetas “sumidas” – valendo cerca de 200 milhões de dólares como farinha de pescado – simplesmente não foram contabilizadas. Peixes fantasmas não pagam impostos e as empresas evitam a taxa de direitos de pesca, cobrada por tonelada pesada. Pescadores, pagos pelo peso do que pescam, tem seus ganhos roubados.

O banco de dados registra apenas dados referentes à anchoveta. Para cavala, uma espécie exaustivamente pescada em águas próximas, dificilmente existe controle. A investigação do ICIJ descobriu que nos últimos quatro anos, as cotas foram excedidas praticamente metade das vezes. Embarcações também desembarcaram grandes porcentagens de peixes que estavam abaixo do limite de peso permitido.

Estas descobertas encaixam-se num panorama de sobrepesca e controle escasso no Pacífico Sul. Em duas décadas, a cavala declinou de uma reserva de cerca de 30 milhões de toneladas para menos de 3 milhões. Navios asiáticos e europeus que esgotaram outros oceanos agoram rumam para o sul, em direção ao Peru e Chile.
 


 

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